MORAES, A.C.R. O Positivismo como fundamento da Geografia Tradicional.

Bibliografia
           Moraes, A.C.R. O Positivismo como fundamento da Geografia Tradicional.
  In: Geografia Pequena História Crítica. São Paulo. Ed.Hucitec, 4º edição, 1983.


 O POSITIVISMO COMO FUNDAMENTO DA GEOGRAFIA TRADICIONAL


  • “Os postulados do positivismo (aqui entendido como conjunto das correntes não-dialéticas) vão ser o patamar pelo qual se ergue o pensamento geográfico tradicional, dando-lhe unidade”. p21
  • “Uma primeira manifestação dessa filiação positivista esta na redução da realidade ao mundo dos sentidos, isto é, em circunscrever todo o trabalho científico ao domínio da aparência dos fenômenos. Assim, para o positivismo, os estudos devem restringir-se aos aspectos visíveis do real, mensuráveis, palpáveis....A Geografia é uma ciência empírica, pautada na observação.... A descrição, a enumeração e classificação dos fatos referentes ao espaço são momentos de sua apreensão, mas a Geografia Tradicional se limitou a eles... E, desta forma, comprometeu estes próprios procedimentos, ora fazendo relações entre elementos de qualidade distinta, ora ignorando mediações e grandezas entre processos, ora formulando  juízos genéricos apressados. E sempre concluindo com a elaboração de tipos formais, a-históricos, e, enquanto tais, abstratos (sem correspondência com os fatos concretos)....Por esta razão, a Geografia Geral, tão almejada pelos geógrafos, na prática sempre se restringiu aos compêndios enumerativos e exaustivos, de triste memória para os estudantes do secundário”. p23
  • “Outra manifestação da filiação positivista também traduzida numa máxima geográfica, é a idéia de existência de um único método de interpretação, comum a todas as ciências, isto é, a não aceitação da diferença de qualidade entre o domínio das ciências humanas e ciências naturais.... A geografia é uma ciência de contato entre o domínio da natureza e o da humanidade... Daí a Geografia falar sempre em população (um conceito puramente numérico), e tão pouco em sociedade. Na verdade, a Geografia sempre procurou ser uma ciência natural dos fenômenos humanos, na colocação de J.Brunhes de que, para a Geografia, a casa (como elemento fixo de paisagem) tem maior importância do que o morador, afirmação de C.Vallaux, de que o homem importa, para a análise geográfica, por ser um agente de modelagem do relevo, por sua ação como força de erosão. Tal perspectiva naturalizante aparece com clareza no fato de buscar esta disciplina a compreensão do relacionamento entre o homem e a natureza, sem se preocupar com a relação entre os homens”. p24
  • “Assim, a unidade do pensamento geográfico tradicional adviria do fundamento comum tomado ao positivismo, manifesto numa postura geral, profundamente empirista e naturalista... A Geografia e uma ciência de síntese. ...Tomar-se-ia a Geografia como a culminância do conhecimento cientifico, isto é, como a disciplina que relacionaria e ordenaria os conhecimentos, produzidos por todas as demais ciências. ... Tudo aquilo que interfere na vida da superfície da Terra seria passível de integrar o estudo. ... Esta concepção atribui à Geografia um caráter anti-sistemático, que a distinguiria das demais ciências sendo por excelência um conhecimento sintético, que unificaria os estudos sistemáticos efetuados pelas demais ciências . Na verdade, a idéia de ciência de síntese serviu para encobrir a vaguidade e a indefinição do objeto. ...  Assim, esta máxima serviu para legitimar o estudo geográfico com base num fundamento do qual não se cumpria uma exigência central”.  p25
  • “...A continuidade do pensamento geográfico também se sustentou à custa de alguns princípios elaborados no processo de constituição dessa disciplina e tido como inquestionáveis... Princípios da unidade terrestre  _ a Terra é um todo, que só pode ser compreendido numa visão de conjunto; o princípio da individualidade _  cada lugar tem uma feição, que lhe é própria e que não se reproduz de modo igual em outro lugar; o princípio da atividade_ tudo na natureza está em constante dinamismo; o princípio da conexão_ todos os elementos da superfície terrestre e todos os lugares se inter-relacionam; o princípio da comparação  _ a diversidade dos lugares só pode ser apreendida pela contraposição das individualidades; o princípio da extensão_ todo fenômeno manifesta-se numa porção variável do planeta; o princípio da localização _ a manifestação de todo fenômeno é passível de ser delimitada... Deve-se ressaltar que a idéia de princípio é bastante cara ao pensamento positivista, o que reafirma o juízo de que a Geografia deve sua unidade a um fundamento comum com esta corrente filosófica... A generalidade dos princípios permitia que posicionamentos metodológicos antagônicos convivessem em aparente unidade”. p26
  • “As máximas e os princípios são os responsáveis pela unidade e continuidade da Geografia. Ambos veiculam formulações de um nível bastante elevado de generalidade e vaguidade, permitindo que se englobem em seu seio propostas díspares e mesmo antagônicas”. p26
  • “As máximas e os princípios são tomados como afirmações verdadeiras, que em momento nenhum são questionadas. Se questionado e contestado esse apoio, viria a ruir o edifício geográfico”. p27
  • “... Sem se haver penetrado no movimento de renovação da Geografia, o qual engendra uma série de novas definições, colocando perspectivas de fundamentação fora do positivismo clássico (a Fenomenologia, o estruturalismo, o neopositivismo, e o marxismo, entre outras), abre à discussão geográfica caminhos até então nunca trilhados, o que vai multiplicar as dificuldades existentes para definir a matéria tratada por esta disciplina”. p28
  • “Na verdade, as máximas, os princípios e, principalmente, o trabalho de pesquisa, engendrado em anos de atividades (quase dois séculos de Geografia), acabam por constituir um temário geral, ao qual se associa a designação da geografia.... É ele que, apesar de constituído no período da geografia tradicional, é mantido pelo movimento renovador, criando um elo entre os produtos deste dois pensamentos. Entretanto, como foi mencionado, este temário é implícito ... Assim, sua fluidez não lhe permite ser a definição do objeto em si”. p28
  • “Pelo temário geral da Geografia, esta disciplina discute os fatos referentes ao espaço e, mas, a um espaço concreto finito e delimitável _ a superfície terrestre . Só será geográfico no estudo que aborde a forma, ou a formação, ou a dinâmica (movimento ou funcionamento), ou a organização, ou a transformação do  espaço terrestre. ... Seria vã toda tentativa de buscar um consenso, que não fosse vago. A impossibilidade de existir um conteúdo consensual na Geografia está no fato de o temário geral se substantivar em propostas apoiadas em concepções de mundo, em metodologias e em posicionamentos sociais diversificados, e muitas vezes antagônicos”. p29
  • “... A luta de classes corresponde à luta ideológica, que tem, no domínio do conhecimento cientifico, seu palco privilegiado. ...As diferenciadas propostas veicularão sempre conteúdos e interesses de classe. Sendo a estrutura de classe contraditória, as propostas serão necessariamente antagônicas”. p30
  • “Frente as estas razões, a pergunta o que é Geografia? ... Geografia é apenas um rótulo referido a um temário geral. E que este só se substantiva através de propostas orientadas por métodos, que expressam posicionamentos sociais. Assim, o que é Geografia dependerá da postura política, do engajamento social de quem faz Geografia. Assim, existirão tantas Geografias, quantos forem os posicionamentos sociais existentes”. p30
  • “... Um geógrafo militante já disse que a Geografia e uma prática social referida ao espaço terrestre, a qual pode ser de dominação (como tem sido na maioria das vezes), mas também de libertação. ...Em outras palavras, investigar o estágio da luta ideológica, desenvolvida nesse campo de debate específico, que é a Geografia”. p31  


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