CARLOS, Ana Fani. Espaço e Indústria.

Bibliografia:
CARLOS, Ana Fani. Espaço e Indústria. 5º edição. São Paulo: Contexto, 1992.




“O homem aparece na geografia tradicional como um elemento a mais na paisagem, fazendo parte do domínio biológico planetário e não como ser social, membro de uma sociedade que se encontra dividida em classes sociais. Nesta perspectiva, os homens são tratados como indivíduos de uma comunidade e se distribuem pelo planeta; e a geografia se propõe a mostrar as modalidades de ocupação dos diversos grupos humanos. Aqui o objeto da geografia é o estudo das coletividades.”(p.11)
“A idéia da distribuição dos homens sobre a terra produz a idéia do homem no espaço enquanto localização da atividade humana, portando exterior ao homem. O espaço é humano neste contexto por que o homem o habita; o homem é o agente que modela o relevo e não um ser social que produz o espaço a imagem e semelhança da sociedade da qual participa. Neste sentido o hoem em sociedade se relaciona com a natureza através de instrumentos criados pelo seu estágio cultural produzindo um modo de vida e um espaço.”(p.11)
“A fase descritiva, em sua expressão última, foi incapaz de analisar o homem enquanto ser social, membro de um sociedade que tem, na contradição das classes, sua características básica. Esta mesma descrição impediu a geografia de elaborar um arcabouço teórico mais aprofundado, na medida em que os trabalho tinham por fim a descrição; lugar pelo lugar, enquanto único.”(p.12) estudo ideográfico.
Isto significa que encontrávamos estudos sobre países e regiões do globo, muito minuciosas, mas que não tinham relações com outros países ou outras regiões. Tal fato impedia a elaboração de teorias que pudessem explicar de modo global os fenômenos que observávamos tanto em Paris como em São Paulo, por exemplo.”(p.12)
Os fenômenos aparecem de forma isolada, sem quaisquer relações, a ponto do subdesenvolvimento aparecer com estágio do desenvolvimento e os fenômenos naturais isolados dos humanos.O próprio espaço é exterior ao homem.”(p.13)
A dimensão da exterioridade que o espaço geográfico tem em relação a sociedade é, a nosso ver, a principal característica da chamada geografia tradicional.”(p.13)
“À esta noção de espaço enquanto palco da atividade do homem, organizado em função das necessidades dos grupos humanos, entendendo a terra como morada, contrapõe-se a idéia do espaço produzido pela sociedade onde o trabalho, enquanto atividade produtiva, tem o caráter de mediados da relação. È através do trabalho que o homem se relaciona com a natureza.”(p.13)
“Em primeiro lugar, o espaço geográfico, não é a base da história mundial, mas é o produto das relações que ocorrem, num determinado momento histórico, entre a sociedade e o meio circundante.”(p.14)

A GEOGRAFIA E O ESPAÇO

“O homem transforma a natureza, humanizando-a, apropriando se dela e incorporando-a ao seu universo”(p.16)
“O trabalho como categoria central da análise do processo espacial nos remete às seguintes questões:
- o espaço geográfico visto como produto da história das relações que o homem mantém com a natureza, através do trabalho (no mesmo processo de criação do humano e de modificação da natureza), é fruto de uma produção geral da sociedade como um todo;
- o trabalho como atividade do ser humano visa satisfazer necessidades, e na medida que estas são históricas e que a atividade que se satisfaz cria novas, a criação de um espaço diferenciado dá-se em função das condições materiais de produção e do estágio de desenvolvimento das forças produtivas;
- o trabalho sendo sempre um  processo de apropriação pelo ser humano permite discutir as formas como esta apropriação se realiza, colocando em discussão hoje o espaço como um produto social apropriado individualmente e, portanto alienado.”(p.17)
“Neste caso específico cabe considerar que o homem, no mundo de hoje, só pode ter acesso a um emprego através da venda de sua força de trabalho. Ele não é necessariamente , o dono do instrumento e ferramentas do trabalho. O produto do seu trabalho não lhe pertence, pertence ao dono do capital [...] Dentro desse raciocínio se desenvolve a idéia do processo de trabalho como um processo de alienação, pois não é determinado pelo sujeito e nem este sujeito se torna dono do seu produto.”(p.17)

A REPRODUÇÃO DO ESPAÇO

“A reprodução do espaço aparece como resultado do processo de produção e reprodução do capital, que se realiza como capital adicional e que tem como condição de existência, a apropriação do trabalho alheio”.(p.18)
“ A sociedade como um todo se articula, através do processo de produção geral, na criação do espaço, mas como o modo de produção  está assentado em relações de poder conferidas pela propriedade privada, torna extremamente diferenciada a apropriação do produto do trabalho.”(p.19)

O ESPAÇO E A INDÚSTRIA

“A indústria é a atividade capaz de produzir e desenvolver a integração de vastas áreas.”(p.20)
As teorias sobre a localização industrial expressam a capacidade de articulação espacial da indústria, mas é necessário salientar que o desenvolvimento das forças produtivas tem colocado em xeque certos dados sobre a localização da indústria que tende a se tornar-se ubígua.”(p.20)

A INDÚSTRIA E O URBANO

“O processo de industrialização, ao provocar uma profunda alteração na divisão social e espacial do trabalho, implica mudanças radicais na vida do homem. A aglomeração da população, dos meios de produção e de capitais num determinado ponto do espaço, multiplica os pontos de concentração e produz uma rede urbana articulada e hierarquizada.”(p.35)

O CICLO DO CAPITAL

“Essa parcela da população que vende sua força de trabalho com o objetivo de reprodução de sua existência, emprega seu salário de modo a sustentar esta existência. São gastos com habitação, alimentação, energia, saúde, transportes, educação, saneamento, vestuário, lazer, etc. Estas necessidades exigem uma certa aglomeração imposta pela socialização do processo de produção e criam um espaço peculiar, diferenciado do agrário.”(p.37)

O CAPITAL E A CIDADE

“As contradições espaciais emergem amplamente. Os contrastes e as desigualdades de renda afloram em toda sua plenitude. O acesso a um pedaço de terra, o tamanho, o tipo de material de construção vão espelhar mais nitidamente as diferenciações de classe. O acesso a habitação e aos meios de consumo coletivo, serão diferenciados segundo a classe social.”(p.41)
“O espaço geográfico produz-se em função da reprodução da vida humana, por outro lado, permite o desenvolvimento da produção capitalista. A cidade aparece como a justaposição de unidades produtivas, através da articulação entre os capitais individuais e a circulação geral. Ela permite a integração dos diversos processos produtivos, implicando uma configuração espacial própria a garantir a fluidez do ciclo do capital.”(p.41)
“O modo de produção capitalista cria um espaço como todo modo de produção. P pressuposto é que no capitalismo, a produção só ocorrerá se permitir a valorização do capital. Na produção do espaço há algo mais, um lado estratégico e político de grande importância, pois não é uma produção qualquer: acrescenta algo decisivo a esta, posto que é também reprodução das relações de produção. Isto significa que a medida que o capitalismo se desenvolve e a cidade cresce não serão criados apenas produtos, mas também comportamentos humanos.”(p.42)
“Do ponto de vista da cidade, o uso do solo voltado ao processo produtivo, através dos estabelecimentos industriais, poderá ser discutido partindo-se da sua localização.”(p.43)
“A localização dos estabelecimentos industriais variará de acordo com o tipo de produto que fabrica e do tipo de indústria. Enquanto o estabelecimento (nacional) de pequeno e médio porte vincula-se, fundamentalmente, à minimização dos custos de produção e maximização dos lucros, os estabelecimentos vinculados às coorporações multinacionais, certamente se localizarão em função de outros objetivos. Para estes o que está em jogo é a segurança da corporação, do conjunto como um todo. Hoje a grande indústria multinacional diversifica seus produtos e espalha pelo espaço mundial seus estabelecimentos industriais. Este feito responde a uma estratégia de conjunto para manter seus lucros”.(p.43) Weber
“Assim o espaço produzido primordialmente em função dos objetivos e necessidades do capital, aparece como algo externo ao homem, apesar de ser produzido por ele, na medida que o processo de trabalho é alienado.”(p.44)

INDUSTRIALIZAÇÃO E URBANIZAÇÃO

“A base universal do desenvolvimento da indústria é representada pela troca geral, no mercado mundial e, em conseqüência, pelo conjunto articulado das atividades de produção, distribuição, circulação e troca.”(p.44)
“A industrialização é um fenômeno concentrado no espaço enquanto produto da aglomeração de meios de produção, mão de obra, capitais e mercadorias.”(p.44)
“Em síntese podemos dizer que a existência da cidade decorre:
-da divisão do trabalho;
-da organização da sociedade em classes sociais;
-da acumulação tecnológica
-da produção do excedente agrícola decorre da evolução tecnológica
-de uma certa concentração espacial das atividades não agrícolas. “(p.45)
“O modo de produção capitalista reproduz o fenômeno urbano com características peculiares, aspectos e significados diferenciados.”(p.45)
“O capitalismo tende a potencializar a aglomeração, aprofundando a articulação entre os lugares complementares através da comunicação e dos transportes e com isso propicia o fim da atomização do espaço.”(p.46)
“A urbanização capitalista produz uma transformação radical na vida do indivíduo.O individualismo tente a crescer nas cidades; os laços entre os habitantes se enfraquece. Todos estão vinculados e ligados à massa humana, amorfa e desintegrada.”(p.46)
“Criam-se grandes aglomerações acentuadas pelo estágio do capitalismo monopolista.”(p.47) – internacionalização do capital e mundialização das trocas
“Aglomeração espacial da atividade industrial deve-se à necessidade de utilização da mesma infraestrutura de serviços especializados (energia, água, esgoto, transporte, comunicação, etc.”(p.47/48)

A UNIVERSALIZAÇÃO DO PROCESSO

“O processo de industrialização intensificou a urbanização a ponto de ambos se tornarem indissociáveis. Produziu-se um novo urbano a partir da criação de novos padrões de produção e consumo. Criaram-se novas formas de convívio entre as pessoas a partir da construção de um novo modo de vida.Gerou-se profundas alterações de valores e crenças que afetaram os costumes e as relações tradicionais. Era emergência de um novo homem com novas aspirações, motivações e valores.”(p.49)
“A grande cidade, a metrópole, produto da socialização e da divisão do trabalho, produziu a desintegração do coletivo e a atomização das relações sociais, circunscritas a menos célula familiar. O comportamento dos indivíduos e seus movimentos, aspirações e necessidades passaram a ser determinados pelo exterior.”(p.49)

A METRÓPOLE

“No estágio do capitalismo concorrencial, como a lógica do capital está fundamentada exclusivamente na maximização do lucro a curto prazo, a ainda pequena dimensão das fábricas e sua multiplicidade possibilitam baixo grau de concentração.”(p.50)
“Na fase monopolista- centrada nas grandes firmas [...] a articulação e especialização entre parcelas espaciais intensificam-se e ganham nova trama de relações na medida em que surgem os conglomerados e as empresas multinacionais junto com as profundas transformações dos meios de comunicação e transporte.”(p.50)
“Este fenômeno é conseqüência da mundialização da economia através da transnacionalização do mercado de capitais e pela reestruturação do capital em escala global, proveniente da acumulação acelerada.”(p.51)

O ESPAÇO TRANSNACIONAL

UNIVERSALIDADE E PRODUTIVIDADE

“A noção de subdesenvolvimento- desenvolvimento é produto do fato de que o modo de produção capitalista desenvolve-se de forma desigual que se expressa, concretamente, em diferenças na composição orgânica do capital e em graus de produtividade diferenciados.”(p.53)
“Estes diferenciais de produtividade e preço, decorrentes dos desníveis de desenvolvimento das forças produtivas, aparecem através das trocas internacionais do comércio exterior, como conseqüência do desenvolvimento desigual, gerado pelo processo de acumulação capitalista. Em cada fase do desenvolvimento do capitalismo, a composição do capital se apresenta de forma correlacionada ao desenvolvimento das forças produtivas. Convém lembrar que o que vale para as diversas fases sucessivas do desenvolvimento num mesmo país vale para diversas fases coexistentes de desenvolvimentos entre diferentes países.”(p.54)

À GUISA DE CONCLUSÃO

E O HOMEM?

“O capital destrói a atomização das relações de produção das pequenas aglomerações humanas. A universalização do capital produziu a “massa humana” e isolou o homem. A grande metrópole produziu e aprofundos o individualismo exacerbado.”(p.62)
“Tal subversão é conseguida pela imposição dos valores burgueses de erro e produtividade, criando a ilusão da coletividade. Dentro dessa “coletividade produzida”, o indivíduo não se identifica com o outro e não são levados em conta do desenvolvimento de sua potencialidade, suas inquietações e utopias. São os objetivos da empresa que se impões e estes determinarão a relação dos indivíduos que compões o grupo.”(p.62) Durkhein

E A CIDADE FICA DIFERENTE DA INDUSTRIA?

“A cidade reproduz a vida dentro da indústria dia após dia.”(p.64)
“O corre-corre da cidade não é diferente do ritmo da maquinaria. A alienação do processo de trabalho entre via televisão, na casa do trabalhador. A casa própria é um dos elementos impostos pela necessidade de manter o operário “preso e obediente” ao processo de trabalho.O acesso ao lazer é permeado pela relação monetária.”(p.64)



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